sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Cientistas portugueses descobrem forma de travar metástases cerebrais


Proteina do feijão pode transformar-se num medicamento para mulheres com cancro da mama avançado. Investigação foi financiada pela associação Laço

Tudo começou com uma desilusão. A partir de 2008, um estudo atrás do outro vieram provar que a aposta em rastreio ao cancro da mama, através de mamografia, não estava a dar os resultados esperados. 

Os cancros verdadeiramente agressivos, que se espalham a outros órgãos e acabam por matar, continuavam a fazer vítimas. Num dos estudos, feito no Canadá, concluiu-se que a probabilidade de uma mulher que cumpre a mamografia anual morrer de cancro da mama é igual à de uma mulher que não segue a recomendação. 

Face a estes resultados, Lynne Archibald, fundadora da associação de apoio a mulheres com cancro da mama Laço, promoveu um debate na organização e acabou por ficar decidido mudar completamente a estratégia da instituição. 

Em vez de apoiar o rastreio, como tinha sido a tónica desde a sua fundação, o foco passou a estar no apoio à investigação. "O cancro da mama metastático não está a diminuir, as mulheres continuam a morrer e percebemos que a forma de mudar isto é apoiar a ciência", conta. "Porque quando há dinheiro as coisas acontecem."

Diana Gaspar, investigadora do Instituto de Medicina Molecular (IMM) João Lobo Antunes, foi uma das beneficiárias das bolsas financiadas pela associação. Agora, três anos depois de ter iniciado o projeto, saíram os primeiros resultados. 

Em laboratório, a cientista verificou que uma proteína extraída do feijão, a PvD1, consegue travar a invasão do cérebro pelas células tumorais. "Um grupo no Brasil já conhecia as propriedades antifúngicas da PvD1. Nós quisemos verificar as suas capacidades antitumorais", explica Diana Gaspar.

É o grande terror de uma mulher diagnosticada com cancro da mama: que este se espalhe e chegue ao cérebro. Apesar de não haver dados exatos, estima-se que existam em Portugal cinco mil mulheres com cancro da mama metastático, para quem há poucas opções terapêuticas e ainda um forte estigma

Com o financiamento da Laço, Diana Gaspar foi capaz de verificar que esta pequena proteína interfere com a capacidade de as células tumorais, transportadas pela corrente sanguínea, se fixarem à barreira hemato-encefálica, que protege o cérebro - mas que deixa escapar alguns invasores. "A proteína diminui a viabilidade das células tumorais que, mesmo escapando para a corrente sanguínea, chegam à barreira com as propriedades alteradas."

O trabalho, publicado na revista científica Nanoscale, dependeu do uso de um equipamento ultrassofisticado, o microscópio de força atómica, que permite observar ao nível do átomo. Todos os consumíveis gastos no projeto foram suportados pela bolsa da Laço, a associação que acabou por se transformar no Fundo iMM-Laço e está, desde o início de 2018, sedeado no próprio IMM. "Foi uma tristeza para todos constatar que a deteção precoce não evitava as mortes por cancro da mama avançado. Mas acreditamos na Ciência", sublinha Lynne Archibald.

Fã confessa de feijoada, Diana Gaspar esclarece, no entanto, que não é por se comer feijão que se conseguirá ter qualquer efeito na prevenção do cancro da mama. "Seria preciso comer muitos quilos de feijão de uma só vez."

O caminho agora será prosseguir a investigação, testando o efeito da proteína do feijão em ratinho. É possível que, no futuro, fique disponível um concentrado de feijão num comprimido.

Fonte: Visão

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