A vigilância crescente de dados digitais, de espaços públicos por videovigilância e de dados de localização, muitas vezes em nome da segurança, está a ameaçar a privacidade dos cidadãos, criando um Estado securitário, uma preocupação que foi hoje partilhada numa sessão organizada pela Comissão Nacional de Proteção de Dados (CNPD) para assinalar o Dia Europeu de Proteção de Dados que hoje se celebra.
O tema “Controlar os seus dados pessoais é controlar a identidade e escolher em liberdade” deu o mote a um debate onde a exibição do documentário PANOPTICON de Peter Vlemmix (em baixo em versão integral) marcou um retrato da realidade, embora já tenha sido realizado em 2012, ainda antes da denúncia de Edward Snowden do sistema de NSA.
O documentário descreve o crescimento de sistemas de controle na Holanda, desde uma solução que verifica a idade dos clientes em lojas de bebidas, a câmaras de reconhecimento facial na utilização de transportes públicos para identificar passageiros indesejáveis, passando pelo controle de vídeo nas autoestradas e nas ruas, à leitura dos emails e do rasto de pesquisas no Google e posts no Facebook, se tornaram prática comum.
Tudo formas que são “utilitárias” mas que ultrapassam em muito o que é necessário e contradizem a definição de privacidade estabelecida pela ONU em 1966, onde se destaca que ninguém pode ser objeto de vigilância arbitrária. E questões que se vão aprofundar com a disseminação da Internet das Coisas.
Mas será que temos de nos habituar a um mundo onde as empresas e os Governos traçam o nosso perfil de forma constante e sabem mais sobre nós do que a própria família?
“As ameaças [de terrorismo] têm servido para implementar soluções compressoras. As novas tecnologias ou o uso inovador de tecnologias mais conhecidas são implementadas como forma de aumentar a segurança, mas temos o outro lado da moeda: as soluções exigem a recolha e tratamento de dados e atingem a privacidade”, lembrou Filipa Calvão, presidente da CNPD, em jeito de introdução, lembrando que os instrumentos de proteção da privacidade são formas de garante da identidade e liberdade. “É necessário encontrar o equilíbrio entre valores apenas aparentemente contraditórios que têm necessariamente de se conciliar”, sublinha.
Na mesma linha de ideias, José Vitor Malheiros recorreu a variadíssimos exemplos para mostrar como frequentemente a informação pessoal é devassada, por acesso a extratos da conta bancária, por utilização de tags RFID ou de cartões de fidelização. Gestores de conta que sabem onde compra os sapatos e a marca de que gosta, cuecas com RFID que podem ser usadas pelas lojas para fazer sugestões de aquisição, ou supermercados que podem sugerir comprar mais meia dúzia de ovos.
Preocupado com a pressão feita pelas entidades ligadas ao poder para passar a mensagem de que as pessoas que não têm nada a esconder não têm de se inquietar com estes sistemas de vigilância, o professor da Universidade Nova, e ex-jornalista do Público, defende que esta é uma noção perigosa que deve ser combatida de forma veemente. “A privacidade e o anonimato são essenciais para a liberdade […] Eu tenho segredos e até pulsão para praticar crimes que não vou cometer”, explica.
A necessidade de manter segredos, que é uma das bases da liberdade nas sociedades democráticas, e de cultivar a expressão das múltiplas personnas (com o perfil profissional, o dos amigos e o dos colegas do futebol) são apontados como essenciais. “Quando estamos a ser observados não somos tão livres. Temos direito a ter várias personnas e isso não é dissimulação, nem hipocrisia, temos direito a ter várias histórias”, justifica, adiantando que “não estou disponível para prescindir dos meus segredos e das várias personnas e acho que o Estado não tem direito de saber tudo sobre mim para prevenir qualquer crime que venha a cometer”.
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