A cabeça em forma de martelo dos vermes Diversibipalium multilineatum PIERRE GROS/DR
Um grupo de investigadores alerta que estes vermes não são originários da Europa e representam uma ameaça para a biodiversidade, ainda que tivessem passado despercebidos na comunidade científica. Uma espécie destes vermes já foi encontrada em Portugal.
Foram precisos mais de 20 anos para que os cientistas franceses começassem a estranhar a presença de uns vermes predadores gigantes (do género Bipalioum e Diversibipalium) que infestavam os jardins do país. “Enquanto cientistas, ficámos surpreendidos que estas minhocas longas e com cores garridas [um dos vermes é azul] tenham escapado durante tanto tempo à atenção dos cientistas e das autoridades num país europeu desenvolvido”, referem os autores de um estudo publicado esta terça-feira na revista científica PeerJ, realçando que estas espécies são um perigo para a fauna nativa do país.
Com base em observações e registos que datam de 1999, o estudo dá também lugar à “ciência feita por cidadãos”, já que grande parte das descobertas foram feitas por moradores de França e de outros territórios ultramarinos – o registo chegava às mãos dos cientistas por email e até por telefone. Foi então constatada a existência de três espécies nas zonas metropolitanas de França: Bipalium kewense, Diversibipalium multilineatum e uma terceira espécie Diversibipaliumde cor preta, ainda sem nome.
Um verme da espécie Bipalium kewense PIERRE GROS/DR
As espécies de vermes predadores do género Bipalium e Diversibipalium são gigantes comparados com as minhocas normais. Rondam os 60 centímetros de comprimento (mas há uma espécie que pode chegar a um metro de comprimento, a Bipalium nobile) e têm uma outra característica distintiva: a forma em martelo das suas cabeças. Enquanto os vermes mais pequenos são autóctones da Europa, estas espécies maiores não o são.
A Bipalium kewense também já chegou a Portugal: em 2016, foi encontrado um exemplar de 25 centímetros na ilha de São Miguel, nos Açores, num jardim ao ar livre. No mesmo ano, foi vista pela primeira vez na ilha de São Tomé e Príncipe. Os cientistas responsáveis pelo relatório verificaram também a presença de algumas destas espécies em territórios franceses além-mar, como a Polinésia Francesa (Oceania), Guiana Francesa (América do Sul) ou as ilhas de Guadalupe e São Bartolomeu (América Central). As espécies são originárias das regiões quentes da Ásia, e foram se espalhando pelo mundo. Segundo o estudo, estes vermes achatados são introduzidos noutros países através do transporte de plantas.
Um perigo dissipado na cegueira dos cientistas
O naturalista amador Pierre Gros (que viria a ser um dos autores do estudo) foi uma das primeiras pessoas a estranhar a existência dos animais em solo francês, razão que o levou a contactar o especialista Jean-Lou Justine – que começou por desconfiar da veracidade das fotografias que lhe foram enviadas. Foi assim que começou a investigação. Agora, os cientistas dizem que os resultados do estudo mostram que existe um “ponto cego” na comunidade científica e nas autoridades, que não se apercebem que estavam perante uma invasão destes animais conspícuos.
Verme da espécie Bipalium vagum encontradas na Guiana Francesa SÉBASTIEN SANT/PARC AMAZONIEN DE GUYANE
Os cientistas (quatro franceses e um australiano) admitem que estas espécies predadoras são um perigo para a fauna nativa dos países onde são introduzidas, sobretudo para os animais mais pequenos e vulneráveis. O impacto dessa ameaça não é certo (são escassos os dados disponíveis), mas não deve ser negligenciado, já que estamos a falar dos “maiores predadores invertebrados terrestres”. Para alcançar as suas presas, algumas destas espécies produzem uma neurotoxina potente, a tetrodoxina, que as imobiliza.
Antes deste estudo, muitas das espécies encontradas não eram devidamente identificadas (pensavam tratar-se de ténias, lesmas ou simples minhocas), dizem os cientistas. Em 2013, as crianças de um jardim-de-infância francês diziam estar assustadas por existirem centenas de “pequenas cobras” no jardim da escola; mais tarde, o grupo de investigadores identificaram-nas como sendo da espécie Diversibipalium multilineatum.
O verme azul da espécie Diversibipalium LAURENT CHARLES/DR
CLAUDIA CARVALHO SILVA
Fonte: Publico
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