Não é ainda a confirmação da vida, mas é mais um passo na caminhada. NASA discute em conferência, transmitida em direto aqui, as implicações da descoberta
O rover Curiosity da NASA detetou pela primeira vez sem margem para dúvidas a presença de moléculas orgânicas no solo marciano. Não é ainda a confirmação da vida, nem sequer da existência de vida no passado longínquo do planeta, uma vez que as moléculas orgânicas também podem ter um origem externa aos processos da vida. Mas esta descoberta é mais um passo de gigante nessa demanda e, quem sabe, nessa direção.
As análises que permitiram chegar agora a esta conclusão foram feitas por um dos instrumentos do Curiosity, o SAM, de Sample Analisys at Mars, e mostram "provas conclusivas" da existência de compostos orgânicos em rochas que o rover recolheu na cratera Gale, uma local onde parecem estar preservadas as condições geológicas de há 3,5 mil milhões de anos - a mesma época em que a vida despontou no planeta vizinho: a Terra.
A presença dos compostos orgânicos, sublinham os autores do artigo sobre o achado, que é publicado hoje na Science, não significa necessariamente que eles resultam dos processos da vida, mas a sua descoberta agora "dá novas pistas para se compreender melhor os processos e as condições do planeta".
Anteriores experiências feitas pela sonda Curiosity, em 2014, já tinham apontado para a presença de compostos orgânicos no solo do Planeta Vermelho, mas os dados acabaram por não ser conclusivos na altura porque havia fortes possibilidades de haver contaminação das experiências. Agora não há qualquer dúvida: a sua presença está confirmada e os cientistas que analisaram os dados pensam que estes são compostos de moléculas maiores que teriam existido ali no passado, há 3,5 mil milhões de anos.
"Os nossos resultados sugerem ser muito provável que matéria orgânica oriunda de várias fontes exista em grande escala nas rochas de Marte", escreve a equipa que analisou os dados do SAM e que foi coordenada por Jennifer Eigenbrode, da centro espacial Goddard, da NASA. "Mesmo que a vida não tenha sido uma fonte-chave [destes compostos orgânicos], há grande potencial para a sua origem provir de meteoritos ou de processos hidrotermais ou ígneos", sublinham os autores.
Além disso, a descoberta sugere que "possa haver vestígios orgânicos mais bem preservados no interior do solo, sob a superfície, onde os efeitos da radiação são reduzidos", o que sublinha a importância de futuras missões para explorar o subsolo marciano, como algumas que já estão a ser preparadas pela própria NASA, mas também pela ESA, na Europa.
Os tijolos da vida
Moléculas orgânicas são os compostos a que costumamos chamar os tijolos da vida: sem eles, a vida não pode estruturar-se. Eles são muito variados, e vão desde os átomos de carbono (um dos elementos encontrados agora pelo Curiosity) aos de hidrogénio (também detetado) e oxigénio.
No caso desta descoberta, além de vestígios de carbono e hidrogénio, os cientistas depararam-se igualmente com elementos com nomes como tiofeno (composto por átomos de hidrogénio, carbono e enxofre), metanotiol, ou ainda dimetilsulfureto, um composto organosulfuroso, entre outros.
No entanto, a presença confirmada destes elementos em Marte não é uma indicação direta da existência (passada ou presente) de vida ali, uma vez que eles podem ser produzidos por reações químicas que não envolvem a comparticipação da vida - e, para já, não existe nenhum indício de que isso tenha acontecido.
Seja como for, esta descoberta, e uma outra igualmente importante, a de que o metano na atmosfera marciana não é constante, mas tem um ciclo anual definido - outra equipa analisou os dados do Curiosity para chegar a esta conclusão e publica um artigo sobre isso nesta mesma edição da Science - "são um grande passo na astrobiologia", como lhe chama a astrobióloga Inge Loes tem Kate, da Universidade de Utrecht, Holanda, num artigo também publicado hoje na Science, e no qual discute as implicações destas duas descobertas.
A especialista não tem dúvidas: "estes resultados são a prova conclusiva da deteção há muito esperada de compostos orgânicos em Marte". E conclui: "a questão sobre se a vida existiu em Marte [na mesma altura em que despontou na Terra, há 3,5 mil milhões de anos] torna-se muito mais oportuna agora, que sabemos que havia moléculas orgânicas na sua superfície nessa época".
Fonte: DN
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