Rede Atlântica de Estações Geodinâmicas e Espaciais, na ilha de Santa Maria |
Na ilha de Santa Maria, há uma estação de recolha de dados para estudos de sismos, georreferenciação, vigilância ou de riscos naturais. No futuro, haverá também uma na ilha das Flores.
Foi em Novembro de 2014 que Rubén Bolaño e Susana García chegaram aos Açores. O casal espanhol trocou a sua vida perto de Madrid pela ilha de Santa Maria. Aqui, os dois engenheiros de telecomunicações fazem a manutenção e configuração dos equipamentos da Rede Atlântica de Estações Geodinâmicas e Espaciais (RAEGE). Um desses equipamentos é um radiotelescópio de 13 metros de diâmetro que localiza fontes celestes para monitorizar a evolução das placas tectónicas ou do movimento do eixo da Terra.
Rodeada por campo e vacas, a estação da RAEGE está ainda apetrechada com um sismógrafo, um gravímetro ou duas estações do sistema de navegação por satélite. O casal tem assim a missão de recolher dados para estudos de sismos, georreferenciação, navegação, vigilância e riscos naturais. “Medimos os parâmetros da Terra. Fazemos geodesia, que é a ciência que estuda a forma e as medidas da Terra”, diz Susana García na sala de controlo onde estão ecrãs com dados. “Aqui só disponibilizamos dados, depois há instituições públicas ou universidades que pegam neles”, avisa Rubén Bolaño.
A ideia é construir também uma destas estações na ilha das Flores
Inaugurada em 2015, esta estação faz parte de um projecto do Governo de Espanha e do Governo Regional dos Açores para meter de pé quatro destas estações. Além da de Santa Maria, há uma já a funcionar em Yebes (Espanha) e vai começar a ser construída outra na ilha de Grã Canária, nas Canárias, ainda este ano.
Também se prevê outra estação para a ilha das Flores, mas ainda não há data para o início da sua construção. “Estamos ainda em negociações [para escolha dos terrenos], mas é muito provável que seja no próximo ano”, afirma Gui Menezes, secretário regional do Mar, Ciência e Tecnologia dos Açores. “Esta estação nas Flores tem um custo estimado em cerca de seis milhões de euros, que provavelmente terá de ser feito por fases porque é um investimento muito grande.”
Quando todas estiverem concluídas, haverá estações em três placas tectónicas: na africana (Santa Maria); na americana (Flores); e na euroasiática (Espanha). “É uma zona de interesse para se perceber como se estão a movimentar as placas tectónicas”, frisa Rubén Bolaño. “E a razão pela qual Santa Maria foi escolhida foi porque fica um pouco afastada da união [das três placas] e para se colocar uma antena [do radiotelescópio] precisávamos de um local estável.”
No coração da antena
Visitemos então o radiotelescópio Very Long Baseline Interferometry (VLBI), que faz parte de um serviço internacional de geodesia e radioastronomia. Entramos – e fazemo-lo porque não está a decorrer nenhuma observação – e logo vemos o computador de controlo da antena do aparelho. “Normalmente, não movemos a antena deste contentor. Temos um software de controlo remoto”, conta Rubén Bolaño.
Depois dirigimo-nos à cabine onde estão os seus motores, e tudo isto para chegarmos à cabine de elevação. Ouve-se um som como se algo estivesse a encher e a despejar. “Aqui é onde está o coração da antena, é o receptor [que capta e amplifica a energia recebida que depois será processada].”
Este radiotelescópio faz várias observações por semana e cada uma dura 24 horas. A sua primeira observação de um dia realizou-se em Março, segundo Rubén Bolaño. “A antena está a apontar para uma fonte [celeste] e acompanha-a durante dois a cinco minutos. Depois muda para outro local diferente para acompanhar outra fonte”, explica. “A ideia é observar o máximo possível de direcções em 24 horas. É como se essas fontes fossem satélites no céu.” Em 24 horas, pode chegar a observar cerca de 200 fontes celestes.
Essas fontes são quasares – objectos astronómicos distantes extremamente luminosos, compostos por enormes buracos negros que agregam a matéria no centro de galáxias. Susana García esclarece que os utilizam como um sistema de referência fixo no céu e que servem para calcular a nossa posição na Terra. Para realizar observações, são necessárias, pelo menos, duas antenas (de diferentes radiotelescópios) para que se aponte à mesma fonte.
O radiotelescópio de 13 metros de diâmetro
Quando a observação termina, os dados são enviados para um ponto central que tem uma espécie de supercomputador que relaciona esses dados. No final, comparam-se os dados de várias antenas e procura-se o máximo de coincidência entre eles. “Ao calcularmos a posição [da Terra] ao longo do tempo, estamos a monitorizar, por exemplo, [a forma] como as placas tectónicas estão a evoluir ou a monitorizar a rotação terrestre”, refere a engenheira.
No futuro, Rubén Bolaño diz que o radiotelescópio observará 24 horas todos os dias. E um dos seus desejos é que haja uma maior homogeneização na distribuição destas antenas por todo o mundo, pois há uma grande concentração no hemisfério norte.
Além do casal espanhol, que pertence ao Governo de Espanha, dois estagiários naturais da ilha trabalham na estação. Já Rubén Bolaño e Susana García tiveram de adaptar-se aos Açores e deixar amigos e família. “Estamos a gostar e a desfrutar da qualidade de vida cá”, conta Susana García a sorrir e sem deixar de dizer que também sentem, por vezes, como a ilha é pequena. “Costumo dizer que, para nós, a RAEGE é um projecto profissional e pessoal porque tivemos de mudar a nossa vida toda para viver aqui.”
Fonte: Publico
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