quinta-feira, 2 de abril de 2020

Super-bactérias destruídas por poção medieval de alho e cebola


Um tratamento com mais de mil anos de idade, usado na Idade Média para combater infecções nos olhos, pode ser a chave para acabar com as super-bactérias resistentes a antibióticos, de acordo com investigadores da Universidade de Nottingham, na Grã-Bretanha.

A equipa de cientistas cientistas recriou um remédio anglo-saxónico do século 10, que continha cebola, alho, vinho e bílis de vaca.

A equipa ficou surpreendida ao descobrir que o remédio antigo tinha exterminado quase completamente a Staphylococcus aureus, famigerada bactéria resistente à meticilina – destruindo em cerca de 90%.

O medicamento foi descrito num antigo manuscrito anglo-saxónico com instruções sobre tratamentos e bálsamos, o Bald’s Leechbook, documento que está arquivado na British Library.

O manuscrito é considerado um dos primeiros exemplos de um “livro medicinal”, diz Tom Feilden, editor científico do programa Today, da BBC.

Bálsamo para os olhos

Christina Lee, especialista em cultura anglo-saxónica da Universidade de Nottingham, traduziu do documento a receita de um “bálsamo para os olhos, feito com alho, cebola ou alho-porro, vinho e bílis de vaca”.

“Escolhemos esta receita porque contém ingredientes, como o alho, que estão a ser investigados actualmente por cientistas devido à sua potencial eficácia em tratamentos com antibióticos”, explica a especialista, que teve a ideia de verificar cientificamente o efeito do remédio.

“Algumas palavras da receita eram ambíguas e tivemos que pensar muito para saber a que ingredientes se referiam”, conta Freya Harrison, investigadora da Escola de Ciências da Vida da mesma universidade.

“Reconstruímos a receita da forma mais fiel que pudemos”, acrescentou a cientista.

Receita detalhada

A receita descreve uma forma muito específica de obter o bálsamo, que inclui a utilização de uma vasilha de metal para ferver a mistura em água, deixada depois em descanso durante nove dias.

Os investigadores provavam o medicamento final e todos os ingredientes frescos separadamente, bem como uma solução de controlo sem os componentes vegetais.

A receita do bálsamo para os olhos de Bald
• Misturar uma quantidade semelhante de alho com cebola ou alho-poró, picada e esmagada em um pilão durante dois minutos.
• Adicionar 25 ml de ‘vinho inglês’, extraído de um vinhedo histórico perto de Glastonbury, que já existia no século 9, para tentar reproduzir a receita da forma mais fiel.
• Dissolver sais biliares bovinos em água destilada e então manter a mistura fria, a quatro graus, durante nove dias.

O remédio resultante da receita medieval exterminou até 90% das bactérias cultivadas em laboratório, tanto em feridas sintéticas como em feridas reais infectadas em ratos.

Harrison afirma que a equipa esperava que o bálsamo demonstrasse “alguma atividade antibiótica”.

“Mas ficámos espantados ao ver a eficácia da combinação de ingredientes“, afirmou.

Os cientistas diluíram a mistura para testar a dosagem ideal contra uma infecção real numa pessoa.

A equipa concluiu que, quando muito diluído, o remédio não consegue matar o Staphylococcus aureus, bactéria que gera infecções na pele e no sangue – uma super-bactéria, resistente a antibióticos como a meticilina.

Mas, mesmo diluído, o remédio consegue interferir na comunicação celular da bactéria.

Para os investigadores, esta é uma “conclusão chave“, já que as células precisam de comunicar entre si, para activar os genes que permitem que elas causem danos nos tecidos infectados.

Os micro-biólogos acreditam que bloquear esta comunicação seria uma forma alternativa de tratar infecções.

As conclusões da equipa de investigadores vão ser apresentadas na Conferência Anual da Sociedade de Microbiologia Geral, em Birmingham.

“Parece que os médicos anglo-saxónicos puseram em prática algo muito próximo dos métodos científicos modernos, com ênfase na observação e na experimentação”, disse Tom Feilden à BBC.

“O Bald’s Leechbook pode conter lições importantes para nossa batalha actual contra a resistência a antibióticos“, acrescentou o cientista.

Fonte: ZAP

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